Alguns noivos
pedem que se pule essa parte no sermão. Casamento é opção, não prisão perpétua.
Recasar não significa começar de novo, mas continuar na mesma estrada.A mudança
na lei arejou os costumes. Até 2009, o divórcio só era possível após um ano de
separação judicial ou dois anos de separação consumada, quando homem e mulher
não estão mais juntos, mas são considerados ainda casados pela Justiça. Se não
há filhos menores ou disputa, agora é possível descasar em minutos, é
instantâneo como uma injeção, às vezes dói, às vezes alivia a dor.Se o amor foi
um dia verdadeiro, o divórcio entristece por um tempo, produz manchas roxas na
alma. O consenso é uma forma civilizada de continuar amigos, quando um quer
mais se separar que o outro. Não sei se estão todos mais felizes. Alguns sim,
outros não. Há viciados em recasamentos. Filhos sofrem, sim, com essas
mudanças de parceiros. Sofrem mais se os pais brigam e continuam infelizes e
resignados até se ver a sós de novo e se divorciar aos 60 anos.
Percebo na
nova geração uma vontade romântica de provar aos pais modernos que o casamento
pode durar tanto quanto o dos avós, para sempre. Mas há também uma turma
apressada que se junta sem se conhecer e acaba separando em um mês ou seis
meses. São uniões relâmpagos que ensinam no tranco. O casamento, por amor ou
fantasia, sempre serviu de atalho para a maturidade. Hoje, muitos jovens não
têm mais ideia das concessões que uma união exige. Não aprendem porque não veem
mais isso em casa. O
núcleo familiar se diluiu, o convívio deixou de ser regular ou forçado. As
relações são mais libertárias, mais pressionadas pelo trabalho de pai e mãe
fora de casa. Não acho hoje mais fácil ou mais difícil manter um amor ou educar
os filhos direito. Sempre foi complicado. Mas o sacrifício em nome das
aparências, tão típico das famílias classe média de Nelson Rodrigues, parece
não fazer mais sentido.Não tenho nenhum amigo ou amiga que ainda esteja no
primeiro casamento. Eles e elas estão no segundo, terceiro ou quarto casamento.
Alguns têm filhos de várias uniões. Outros estão solteiros. Ou estão com
alguém, mas em casas separadas. A credulidade e o ceticismo com o casamento
variam com a experiência, as crenças e o temperamento. Nunca vi qualquer
sentido em casamentos oficiais, documentos assinados, compromissos públicos
firmados ou juras no altar. Não creio na regulamentação dos sentimentos. Nunca
sonhei em casar de branco ou de charrete. Não me considero menos romântica por
causa disso. Adoro rever Notting Hill, com Julia Roberts e Hugh Grant, e me
emociono com declarações de amor.Não casei no papel, nunca dei festa, mas tive
dois filhos, de dois homens que eram meus amores e com quem eu dividia casa,
cumplicidade, projetos e esperanças. Acho rica e emocionante a experiência de
morar junto quando se gera um filho. Prefiro relações estáveis a ser
freelancer.
É um privilégio estar apaixonada. Namoro há 20 anos o mesmo homem,
cada um em sua casa. Nunca pensamos em morar juntos. Achamos impossível
conciliar o encantamento à convivência obrigatória. Temos medo das cobranças,
desrespeitos e ressentimentos que envenenam tantos casais. Os namorados não
estão imunes ao desgaste do tempo, mas se protegem melhor. É raro encontrar
casais felizes há muito tempo juntos – mesmo entre os que recasam. Claro que
eles existem. É preciso ter sorte, criatividade, paciência, muito amor e
tesão.O psicanalista britânico Adam Phillips, autor de Monogamia, disse ao
jornal Folha de S.Paulo que “amamos e odiamos um casamento feliz”, porque ele
nos confronta com nossos desejos e nossas frustrações. Para Phillips, uma das
raízes clássicas de conflito é o que os casais pensam da infidelidade eventual.
“Todo mundo tem ciúme sexual, ninguém suporta dividir seu parceiro de sexo,
isso é impossível”, diz ele. “Mas o perigo é a monogamia acabar com o desejo e
virar uma prisão.” Eu, pessoalmente, não acredito na fidelidade eterna. A não
ser que casemos aos 65 anos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário